Março de 2006 - Janeiro de 2009

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Dez 08

Sempre tive pena de não morar ao pé de um vulcão. Acho que é de uma audácia e coragem visível em poucas situações. Está bem que morar nos subúrbios de Lisboa não é para meninos mas não chega aos calcanhares de um vulcão.

Um gajo acorda todas as manhãs, vai à janela e sente-se feliz, apenas por ter vivido mais um dia. É-se destemido só por ter dormido uma noite seguida sem pestanejar.

Para quem gosta de dar nas vistas, não haveria nada mais apropriado. Quem teria argumentos para superiorizar a este condomínio? O que é morar num palácio com mil metros quadrados e vista oceânica quando se tem o relato de Dante a bater-nos à porta?

Note-se, quando falo em vulcão, estou a falar num activo. Daqueles que volta e meia deita lava como quem vomita numa noite de copos. Ali, às golfadas de magma a escaldar. Não confundir com um géiser para entreter turistas ou um local propício à construção de umas termas. Eu estou a falar de caos, hecatombe e destruição.

Vamos dar emoção ao bairro. Qual é a piada de viver numa vizinhança onde nada se passa? Sintam um pouco de emoção nas vossas vidas. Saiam desse marasmo urbanístico. Eu, se tivesse de escolher entre um apartamento num dormitório ou numa encosta onde desmoronamento seja a palavra de ordem, nem pensaria duas vezes.

Sintam a natureza. Adeus buzinas e tubos de escape. Olá derrocadas e cheiro a enxofre. Que maravilha, parece o Inferno. Uma mistura entre o Barreiro e um parque de diversões. Assim já nos íamos habituando, para o choque não ser tão grande quando morrermos.

Permitam que a adrenalina percorra as vossas veias. Hoje pode ser o último dia das nossas vidas. Que o sangue se torne vermelho quente e , sem medos, até ao topo da cratera. Agora ninguém nos irá parar.

 

publicado por Velho Jarreta às 15:58

“No âmago mais profundo da nossa personalidade está uma mentira fundamental, constitutiva e primordial, o proton pseudos, uma construção fantasma através da qual nos empenhamos em esconder a inconsistência da ordem simbólica em que vivemos.”

Slavoj Zizek em “O Invisível Remanescente”

 

A vida humana é claramente sobrevalorizada. O significado da nossa existência, então, atinge proporções ridículas. Em todo o caso, é compreensível. Se não valorizarmos o nosso papel neste mundo não valorizamos rigorosamente nada.

Apesar da imagem que possamos ter de nós próprios, é inegável a nossa insignificância. Achamo-nos muito importantes, com grandes desígnios e objectivos na vida. Mas sejamos realistas. Alguém acha, de forma séria e racional, que tem uma importância vital para os desígnios do Universo? Se os nossos pais não têm andado a foder que nem coelhos, a Terra giraria à mesma e continuaria a haver fome no mundo. E lá por teres ganho o campeonato inter-escolas na preparatória e teres entrado para o Guinness por participar na maior concentração mundial de Drag Queens isso não faz da tua existência uma prioridade universal.

Apesar dos factos, continuamos em teimar o contrário. Enchemos as nossas vidas com montes de histórias de encantar para podermos justificar o facto de cá andarmos. Onde somos sempre personagens principais, lideres do nosso destino, cheios de diálogos brilhantes. Nunca nos passaria pela cabeça relatar do nosso livro de fábulas algo em que fomos meros figurantes. Se não tivemos um papel interveniente então seremos o brilhante observador que narra com toda a sua inteligência e espírito crítico.

Mas que arrogância! Que manias de merda. Quem é que tu pensas que és? Eu digo-te. Tu és um(a) gajo(a). Nada mais, nada menos. E a tua tão fulcral existência, como dizia Bill Hicks, não passa de uma viagem num parque de diversões. No fundo, não é real. Nós é que achamos que sim. E para melhor nos iludirmos, entretemo-nos a enchê-la de luzes e músicas alegóricas.

No fundo, a nossa pequenez e insignificância são indesmentíveis. Somos muito mais desinteressantes e básicos do que aquilo que achamos. E aquilo que achamos não passa de uma ideia ou uma ideologia para dar corpo e ilusão de profundidade ao básico da situação.

Mas nota. Não estou a dizer que não vales nada. Vales sim e muito. O que te estou a dizer é só para te descontraíres e aproveitares o passeio. Entra a bordo que a montanha russa vai começar mais uma viagem. 

 

publicado por Velho Jarreta às 15:03

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